quarta-feira, 30 de junho de 2010

TasOsMontes.Net

A vontade de partilhar na Internet as minhas “viagens” por vilas e aldeias de Trás-os-Montes nasceu há mais de uma década, com os meus primeiros contactos com a Web. A primeira experiência chamou-se “O Trasmontano” e chegou a estar disponível na GeoCities, abarcando todos os concelhos do distrito de Bragança. Morreu principalmente pela minha indisponibilidade para o “alimentar”.
Em 2004 iniciei uma volta pelas freguesias do concelho de Miranda do Douro e fiz nascer o siteÀ Descoberta de Miranda do Douro, primeiro da série e que ainda se mantém online. Pela minha vida profissional e pelo gosto pessoal em conhecer e fotografar a região, novos blogues foram aparecendo, tendo o mesmo formato, mas cada um dedicado a seu concelho. No entanto, como são todos dinamizados por mim, acabam por ter muito em comum. Pensei em partilhar algumas postagens entre eles, mas, a opção final foi a criação de um novo espaço, também em formato blogue (por enquanto), que congregue informação disseminada pelos diferentes locais: À Descoberta de Miranda do Douro, À Descoberta de Vila Flor, À Descoberta de Carrazeda de Ansiães, À Descoberta de Mogadouro, À Descoberta de Freixo de Espada à Cinta, À Descoberta de Torre de Moncorvo e A Linha é Tua (blogue dedicado à Linha do Tua).
A partir de agora toda a (nova) informação dos diferentes blogues será disponibilizada também no espaço TasOsMontes.Net, sem necessidade de andar a saltar de Blogue em Blogue. Tentarei também partilhar, neste espaço, fotografias que tenho colocado na plataforma Flickr, onde tenho mantido uma relativa actividade. Com o tempo pode ser que haja algumas evoluções, uma vez que estou sempre a aprender.
Espero que o novo espaço seja uma janela aberta para o Trás-os-Montes que eu capto, seja em fotografias, seja em palavras.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Livros - "O violino do meu pai"

Anda por estas terras sem contar o tempo, porque não tem idade. Dele dão testemunho os frios gelados e os sóis abrasadores, o seu corpo de granito e a sua alma de vento. É o espírito da terra, o génio que paira sobre estes montes a que muitos deram nome. Viu passar as gerações como aves de arribação, mas só ele permanece nestas pedras eternas, teimosamente imóveis desde a aurora da memória, testemunhas mudas de lutas e tradições, de canseiras e suores, de aventuras pessoais ignoradas da história, de destinos enterrados após luta titânica pela sobrevivência, pela dignidade. O génio das fragas. Deposita um sopro na alma dos que aqui nascem e eles lho devolvem quando regressam ao seu seio; acompanha-os pela vida, curta ou longa, segue-lhes as aspirações e recolhe as suas angústias, as suas solidões; quando os traz de volta, aviva-lhes a memória e dá-lhes sentido à vida. Muitos dos que aqui viveram não sabiam de si o nome ou a pertença. Outros passearam pelos seus campos e florestas, apascentaram os gados e caçaram os javardos, comeram os frutos e beberam o hidromel. Outros mais tarde deram-se nome e identidade, iberos, celtas, banienses, ástures, pagus aunecus. Por aqui passaram romanos, godos e mouros. Apesar das guerras e ermamentos, nunca estas suas terras ficaram desertas: o seu sopro de vida manteve homens e gados, garantiu descendências e sobrevivências, até que os seus filhos se organizaram e hierarquizaram, aceitaram senhores e fizeram guerras, ganharam o pão e o orgulho de ser gente. Chamaram esta terra de Ansiães em homenagem a um poderoso senhor godo vindo de longe há mais de mil anos, mas o génio é intemporal e o seu povo vive dele, desde que há povos.
Comprei, na recente realizada Feira do Livro, o romance "O violino do meu pai: Partir ou Ficar em Trás-os-montes" da autoria de Campos Gouveia. Confesso que foi um pouco pela curiosidade porque, apesar de conhecer pessoalmente o autor e ter lido algumas das suas contribuições na imprensa regional, o romance está longe de ser a literatura que me apetece ler. Quando desfolhei as primeiras folhas e li os primeiros parágrafos, fui agradavelmente surpreendido. A escrita cativou-me. O enredo desenvolve-se numa época que não vivi, mas o espaço é-me familiar. Utiliza uma linguagem simples mas sensível.
O autor, cujo nome real é Fernando Alberto Gouveia, é natural de Belver e integra a direcção da Liga dos Amigos de Belver.
A transcrição do início do livro, feita acima, destina-se a servir de incentivo para a leitura integral da obra. A publicação é da Câmara Municipal de Carrazeda de Ansiães. Infelizmente não se deve encontrar à venda em parte alguma da vila, mas não acredito que não esteja disponível na Biblioteca Municipal.

Nota: as fotografias são em Belver.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Feira Medieval em Carrazeda de Ansiães - Vídeo

Já passou quase uma semana desde a realização do evento “Ansiães na Idade Média”. Este evento foi o primeiro do género realizado por terras de Ansiães.
Passei a tarde de Sábado e o início da noite a acompanhar as actividades que desenvolveram na parte velha da vila e também no castelo de Ansiães. Nunca estive presente no festival de música medieval que se realizou durante alguns anos em Carrazeda de Ansiães (com muita pena minha), por isso não posso fazer comparações.
Por aquilo que pude observar, “Ansiães na Idade Média” foi bem aceite pela população, principalmente pelas pessoas da vila. Realizada à Sexta e Sábado, numa zona rural como é a nossa, afastou, à partida, algumas pessoas que não podem gerir o que não têm, tempo livre. O Domingo seria o dia por excelência, mas deve ter havido alguma incompatibilidade. Quem esteve à frente de todo o espectáculo foi a companhia de teatro VivArte, que tem uma agenda preenchidíssima. No dia 19 estavam em mais dois eventos além do de Carrazeda.
O leque de artistas presentes foi mais do que suficientes para uma primeira realização: Medievus Chorus, Gaiteiricos de Miranda, ArteFalco, Cavaleiro do Tempo, Hoste do Magriço, Cornalusa, Moçarabe(?), etc. Tudo artistas que nos transportam com grande facilidade para outras épocas, no caso para o séc. XIV.
Como apoiante do evento e participante bastante activo, esteve a Escola Profissional de Carrazeda de Ansiães que tiveram aqui uma excelente oportunidade de aprender fazendo. Parece-me que a souberam aproveitar muito bem.
Na minha opinião faltaram duas coisas muito importantes: uma participação local mais forte e público. Na participação local, à parte da já referenciada e excelente participação da Escola Profissional, poderiam ( e talvez devessem) ter participado artesãos locais (cestaria, tanoaria, etc), associações culturais e Juntas de freguesia ( por exemplo com tasquinhas,venda de produtos), grupo de cantares de Carrazeda, etc. Em termos de público, os artistas mereciam ter mais gente a aplaudi-los. No Torneio de armas, no castelo de Ansiães, havia muita gente, mas durante a tarde a zona do “Mercado” esteve muito despida de pessoas. Além do facto de não se realizar num Domingo, parece-me que houve pouca publicitação do evento. Quando contei o que se passou a alguns amigos na Segunda-feira, mostraram uma cara de grande espanto, não sabiam do evento. Estou a falar de pessoas de concelhos vizinhos de Carrazeda.
Também não vi à venda produtos da terra! Vinho, azeite, feijões, chás, fumeiro, doçaria…
Não sei qual foi o balanço que os responsáveis pela organização fizeram. Em próximas realizações deve haver uma mais forte contribuição local e também maior adesão de espectadores. Para atrair gente que deixe aqui algum dinheiro é necessária publicidade, apostar mais nos “comes e bebes” e mostrar-lhes (e vender-lhes), tudo o que produzimos de bom.
Os locais escolhidos serviram às mil maravilhas, os intervenientes foram fantásticos, de maneira que… já só penso na próxima edição.

terça-feira, 22 de junho de 2010

O exotismo na Feira Medieval

Este é um dos momentos de grande exotismo normalmente presentes nas feiras medievais e também foi assim em Carrazeda de Ansiães. A dança do ventre, tendo a executante uma cobra enrolada no seu corpo causa  simultâneamente arrepios e fascinação.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Feira Medieval em Carrazeda de Ansiães

Nos dia 18 e 19 de Junho realizou-se em Carrazeda de Ansiães o evento Ansiães na Idade Média. Organizado pela Câmara Municipal, integrou uma Feira Medieval e o Assalto ao Castelo com Torneio, vindo substituir o Festival Medieval que se realizou durante alguns anos e que chegou a ter alguma projecção.
Na sexta-feira, dia 18, não acompanhei as actividades realizadas na zona envolvente da Fonte das Sereias e Pelourinho. Pelo que pude escutar, já no Sábado, a venda de cerveja ultrapassou as expectativas e o espectáculo de fogo foi muito apreciado.
No Sábado as actividades desenvolveram-se em dois locais distintos: iniciaram na parte velha da vila, junto à antiga cadeia (também escola e agora biblioteca), continuaram no castelo de Ansiães e terminaram, de novo, junto à biblioteca.
Empenhado em não perder nada dos acontecimentos cheguei ao local às três da tarde. O movimento no Burgo era pouco, o que meu deu oportunidade de circular à vontade pelo Mercado. Reconheci imediatamente a maioria das tendas, uma vez que estive em Miranda do Douro nos dias 28,29 e 30 de Maio, onde se realizou uma gigantesca Feira Medieval.
Havia um conjunto de tendas com artefactos representativos da Época Medieval: objectos ligados à cozinha tradicional, à agricultura, ferragem, à guerra, cetraria, etc. Junto à estrada estavam concentradas as tabernas do Burgo, ao que me pude aperceber, todas “geridas” pela Escola Profissional de Carrazeda de Ansiães, entidade apoiante do evento.
Não demorou muito para que chegasse o cortejo, vindo dos lados da igreja matriz. Estandartes, cavaleiros, músicos e saltimbancos, desfilaram até ao centro do mercado. Depois de aberto o mesmo, foi a altura de uma dança exótica executada por uma sedutora encantadora de serpentes.
Foram chegando mais pessoas enquanto as hostes se treinavam no manejo da espada, tendo em vista a defesa do castelo de Ansiães da cobiça dos Castelhanos.
Às dezassete horas partimos todos para o castelo. Havia alguns meios de transporte da Câmara Municipal mas a maioria das pessoas usou o seu próprio transporte o que causou alguns engarrafamentos nas imediações da igreja de S. João Baptista (extra-muros).
Junto à porta de S. Francisco estava montado o cenário para uma das cenas mais animadas e aplaudidas da tarde. A guardar a porta, e espalhados sobre as muralhas, estavam as tropas leais ao Mestre de Avis, sob o comando de Vasco Pires de Sampaio. Pouco depois chegaram os Castelhanos e Homens de Armas de Porto Carreiro, carregando algumas peças de artilharia e um aríete. A troca de palavras agressivas (e brejeiras) e o estado de embriaguez do comandante das tropas Castelhanas, arrancaram verdadeiras gargalhadas na assistência. Os disparos da artilharia assustaram os mais distraídos.
A contenda serenou com o acordo para a realização de um Torneio de Armas no Terreiro do Castelo. Deslocámo-nos todos para o interior do castelo.
O local parecia “talhado” às mil maravilhas para o efeito. A liça ocupou um espaço plano, que, em tempos não muito remotos era cultivado, cercado pela muralha a nascente e por um muro de mais de um metro de altura no restante perímetro.
Dispostos os homens, desenrolou-se um interessante torneio de armas. Os apupos aos castelhanos foram constantes e nem a ferocidade do cavaleiro Olivier, mercenário, agressivo na liça e fora dela, foi suficiente para impedir a vitória dos bravos defensores de Ansiães. O final foi marcado por uma verdadeira batalha campal protagonizada pelos alunos da Escola Profissional, que se mostraram soldados promissores.
Deu-se o regresso ao Fundo da Vila, em Carrazeda de Ansiães para os festejos da vitória sobre os Castelhanos. Música, danças medievais, comes e bebes nas tabernas do Burgo, tudo num ambiente verdadeiramente medieval.
Pelas vinte e uma horas realizou-se a cerimónia do outorgamento do Foral Manuelino à Vila de Ansiães. Seguiram-se momentos musicais e espectáculo com fogo, executado pela Escola Profissional.
Perto das onze da noite deu-se o encerramento do Mercado com os agradecimentos à Câmara Municipal pela realização do evento e a Escola Profissional de Carrazeda de Ansiães pelos apoios prestados.
A noite estava fria e não me demorei muito no recinto. Foi uma tarde e noite muito animadas em que registei um bom conjunto de fotografias e alguns pequenos vídeos que espero vir a mostrar. Também me ocorrem alguns comentários, mas vou guardá-los para mais tarde.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Associação Zíngaros de Carrazeda de Ansiães

13-06-2010 Zíngaros de Carrazeda de Ansiães
Só passado algum tempo é que o grupo adoptou a actual denominação de Zíngaros, termo de origem cigana e que se referia aos músicos que animavam diversas festas e rusgas do concelho.

Após a legalização do grupo, com estatuto e sede próprios, nasce, em 1986, a Associação Zíngaros de Carrazeda de Ansiães. Além das alterações na bandeira e constituição do grupo, a farda da colectividade também foi modificada: os elementos passaram a usar camisa verde, calças pretas listadas a verde, faixa amarela e lista verde no chapéu. Anteriormente, o fardamento do grupo era composto por calças pretas, camisa branca, jalecas cinzentas com mangas e lista vermelha e um chapéu de palha preta com fita vermelha.

Fonte: Etnografia Transmontana

segunda-feira, 14 de junho de 2010

XXII Feira do Livro

Ontem, dia 13 de Junho desloquei-me a Carrazeda de Ansiães para visitar a Feira do Livro, que vai já XXII edição.
Quase sem querer, entrei pelo fundo vila e foi parar o local certo, espaço verde junto à Biblioteca Municipal. Pretendia tirar algumas fotografias para uso posterior e encontrei a feira, sem querer, visto que estava a contar com ela no salão dos Bombeiros, onde se realizou pelo menos nos anos em que eu a visitei.
O dia (tarde) estava destinado à “prata da casa” com actuação de Associações do concelho e lançamento do livro “Poesia Temática”, de Ramiro Mercides Esteves, natural de Codeçais. Na abertura da feira desfilaram os tradicionais Zingaros de Carrazeda, também conhecidos por Zés Pereiras. As gaitas, os bombos e demais músicos e figuras animam qualquer festa e a tarde prometia ser animada.
 Também actuou um grande grupo de jovens aprendizes, tocando violas e cavaquinhos, acompanhados por acordeões. Integrava jovens de várias freguesias que frequentam aulas de música. Foram apresentados alguns sketch de teatro e, às 17 horas , foi feita apresentação do livro de poesia. Curiosamente o livro não se encontrava à venda na feira, e, mesmo depois da sua apresentação não me foi possível encontrá-lo. Tentei adquiri-lo e pedir um autógrafo ao autor, mas não encontrei nem um, nem outro!
Dei uma volta pelas diferentes barraquinhas à procura de outros livros para adquirir. Algumas nem chegaram a abrir! Não se pode dizer que os livros estavam expostos. Estavam colocados em pilhas, de forma pouco prática e pouco apelativa. Pela família, acabámos por comprar perto de 100€ em livros. Daqueles que eu escolhi, sobre o concelho e editados pela Câmara Municipal, vou receber pelo correio um recibo da sua aquisição, dos restantes, nada feito.
Do meu lote destaco um pequeno livro de Ana Mafalda Damião, “Subsídios para o Estudo Hagiográfico”. Em poucas palavras, trata-se de um inventário das imagens de santos e santas existentes nas igrejas e capelas do concelho. Não será um tema que interesse a todos, mas, ainda na noite anterior tinha passado bastante tempo a tentar identificar uma imagem de Santa Clara da igreja de Fontelonga. Estava mesmo a precisar deste livrinho! Comprei mais três, de autores bem conhecidos, do concelho, que espero algum dia divulgar aqui.
 Passei o resto da tarde a conversar com amigos e conhecidos, sobre livros, fotografias, blogues e outras banalidades.
Fiquei com a sensação que o espaço usado este ano para a feira é propício a este tipo de encontros. Em frente do palco não faltou gente, aplaudindo entusiasmada, mas, quanto a mim, os livros ficaram a perder, com a forma como estavam expostos. O estado do tempo nem sempre foi o mais favorável, nos dias em que decorreu a feira. Talvez também tenha ficado com a impressão própria do último dia, mas, o que interessa, é que encontrei livros para ler e “para o ano há mais”.

domingo, 13 de junho de 2010

À Descoberta de Mogo de Malta (2ª parte)

Continuação de: À Descoberta de Mogo de Malta (1ª parte)
Já de automóvel, continuei a subir a rua e segui pela esquerda em direcção ao antigo campo de futebol, onde ainda joguei algumas vezes. Surpreendeu-me a grande quantidade e dimensão dos castanheiros que ainda é possível encontrar. Esta saída do núcleo habitacional destinava-se a visitar umas antigas alminhas, conhecidas como as alminhas da Fraga do Medo. Dada a proximidade a um marco geodésico, não me foi difícil encontrá-las. Há naturais que ainda se recordam de aí existir um retábulo de madeira representando o purgatório. Hoje apenas se notam três buracos abertos na rocha, talvez destinados a prender o dito retábulo. Não me foi confirmado por ninguém, mas é possível que também tenha existido uma cruz em madeira sobre a rocha.
Estes monumentos às Almas do Purgatório foram erguidos nos caminhos e à entrada das localidades. Entre a fraga onde se encontram estas alminhas e a que serve de base ao marco geodésico (785 metros de altitude) passa um caminho que, desde tempos imemoriais, liga Freixiel a Mogo de Malta. Já em tempos recentes, era utilizado pelos habitantes de Freixiel para se deslocarem às feiras a Carrazeda de Ansiães. Este local, com uma fraga larga e solarenga foi utilizado no passado para brincadeiras de crianças ou para encontros amorosos nas tardes de Domingo, até para bailaricos! Com a edificação do santuário, este passou a ser o local de encontro. Também era desta fraga que as pessoas se concentravam para apreciar o fogo-de-artifício lançado no Cabeço, na festa de Nossa Senhora da Assunção nas noites de 15 de Agosto. Nada fornece indicação a respeito do nome, “Fraga do Medo”, nem sequer o tamanho das ditas fragas, que, mesmo antes de serem em parte cortadas para a construção civil, não deviam apresentar um tamanho medonho. Arrisco uma explicação: sendo um caminho com alguma circulação de pessoas, que, neste local, passa entre dois conjuntos de rochas graníticas, a poucas centenas de metros da aldeia, seria um bom local para salteadores e malfeitores esperarem e surpreenderem os viajantes.
A etapa seguinte foi o moinho de vento e a calçada. Contrariamente ao que alguns moradores já me tinham afirmado, o moinho movido a vento funcionou mesmo, fazendo a farinha necessária para o fabrico próprio de pão. Estruturas semelhantes existem em Carrazeda de Ansiães, Vilarinho da Castanheira e Lousa.
Terão também existido pelo menos dois moinhos movidos a água.
De junto do moinho de vento parte a Calçada de Mogo de Malta. A sua cronologia é indeterminada. Destinava-se a proporcionar o acesso a terrenos agrícolas numa zona de forte inclinação e com enormes rochedos. Talvez se prolongasse até Freixiel, seguindo para Vila Flor ou apenas chegasse junto da Ribeira da Cabreira. Há residentes que se recordam se não da construção, pelo menos de obras de recuperação, dado que todos os recantos eram cultivados e havia boas hortas com água para rega.
É muito agradável fazer o percurso da calçada. São aproximadamente 600 metros, com troços muito bem conservados e com uma vista lindíssima para o Vale da Cabreira que pode ser admirado em toda a sua extensão. Na encosta em frente distinguem-se algumas construções encaixadas nas fragas, fazem parte da Quinta do Pobre. Quase consegui ver as laranjeiras carregadas de frutos douradas, que rodeiam o poço onde o senhor Manuel pendurava a pão, à falta de frigorífico.

Não muito longe da calçada, situa-se a Santuário de Nossa Senhora dos Saúde. É o local ideal para apreciar a aldeia e também toda a paisagem em redor, desde o alto da Senhora da Graça, em Samorinha, até ao cabeço de Nossa Senhora da Assunção, em Vilas Boas. O interior da capela é muito simples. Não há qualquer elemento decorativo, simplesmente as imagens de Nossa Senhora da Saúde e de Jesus crucificado. Junto à porta lateral uma placa lembra a curta história deste espaço. A primeira pedra para a construção da capela foi lançada em 19-07-1954 e a inauguração aconteceu em 17-04-1955. Coincidência, há exactamente 55 anos!

Neste local, no último fim-de-semana do mês de Julho, realiza-se grandiosas festas. Das muitas vezes que estive presente nestas festas, recordo alguns anos em que os andores eram decorados com sementes germinadas e com aparas de madeira, vindas das várias tanoarias que ainda existem nos dois Mogos. Esta prática parece ter-se perdido.
 Se não fosse a instabilidade climatérica teria ficado mais tempo neste local tranquilo e inspirador, mas dirigi-me para o Museu Etnográfico. Fiquei admirado com a quantidade e riqueza do acervo. Os objectos estão cuidadosamente agrupados, formando pequenos núcleos, facilmente identificáveis. Podemos encontrar a sala de aulas, a cozinha, o quarto e um vasto conjunto de alfaias agrícolas e de carpintaria. É digno de ser visitado!

Para terminar a minha visita à freguesia de Mogo de Malta dirigi-me ao lar de idosos. Os utentes desta instituição são vinte e dois, quase todos mulheres. As instalações são espaçosas e estão meticulosamente limpas. Sentei-me durante algum tempo na sala de convívio. Acharam piada, alguém interessar-se pelo passado. Conversei demoradamente com Manuel dos Anjos (mais de 90 anos de idade), mas muito lúcido, que me falou do Mogo da sua juventude. É preciso ouvir os idosos, eles têm muito para nos contar e nada voltará a ser como antes.
 A última paragem foi no café da praça. Mais um espaço de convívio, de conversa, de descoberta da particularidade da vida das pessoas. Basta saber ouvir. Regressei a casa já de noite. Uma freguesia tão pequena, que nem sequer tem eleitores suficientes para eleger uma Assembleia de Freguesia, tendo que funcionar em plenário de cidadãos, tem tanto para mostrar a quem a queira visitar!

Publicado no jornal "O Pombal", em Maio de 2010.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

À Descoberta de Mogo de Malta (1ª parte)

São muitos os que, como eu, passam dezenas, centenas de vezes pela Estrada Nacional 214, atravessando Mogo de Ansiães, sem fazerem um pequeno desvio para conhecer a freguesia de Mogo de Malta. No dia 17 de Abril decidi quebrar esta rotina e segui directamente para Mogo de Malta, na tentativa de visitar os seus pontos de interesse, falar com os seus habitantes e Descobrir um pouco da sua história e das suas belezas.
A ideia de existirem dois Mogos, lado a lado, mas integrando freguesias diferentes, sempre me intrigou. Esse era um dos desafios que pretendia desvendar. A minha preocupação quando deixei a estrada nacional e segui pela rua Dr. João Trigo Moutinho foi a de tentar descobrir quando entraria no termo de Mogo de Malta. Imaginei que a linha divisória deveria estar muito próxima do primeiro ponto onde parei o carro, mas não encontrei ninguém que me ajudasse a esclarecer o enigma.
 Continuei pela mesma rua até encontrar umas Alminhas que motivaram mais uma paragem e as primeiras fotografias. Estas alminhas já têm um painel de azulejo monocromático representando o purgatório de onde se ergue uma cruz com Cristo crucificado. Este painel deve ter sido colocado uma época bastante posterior à edificação das alminhas que devem ter tido, numa primeira fase, um painel em madeira, embutido no mesmo lugar onde está o azulejo. Perto destas alminhas é possível encontrar, também na berma da estrada, uma fonte muito antiga, a que se tem acesso descendo por estreitas escadas em pedra. É conhecida pelo nome de Fonte da Mina.
outro caminho, este mais largo, que permitia o acesso a vários terrenos. Continuei por ele, desta vez em direcção à Escola Primária. O caminho largo terminou de repente e continuei por outro carreiro com cerca de meio metro de largura, com parede de um lado e do outro, que me levou à Av. Santa Catarina. De carro nunca me teria apercebido destes caminhos que me permitiram ver Mogo de Malta de uma nova perspectiva. Já na avenida, próximo da Junta de Freguesia, segui à procura de evidências da delimitação da mesma. Recordei um documento de 1859 que dizia que os dois Mogos estavam à distância de 100 metros um do outro, com a igreja de Santa Catarina a meio. Parei perto da Eira da Santa. Alguns residentes mostraram-me, perto da igreja, uma cruz encarnada pintada na estrada, marco actual da longínqua história destes povoados. E foi ao ver esta cruz que a minha memória voou pelo Vale da Cabreira, passou sobre o Pé-de-Cabrito, formação rochosa das mais curiosas que existem no concelho, e continuou em direcção a Folgares, seguindo para Pereiros, até ao Rio Tua. É nesta linha divisória que reside o verdadeiro significado da designação “de Malta”. Os concelhos primitivos de Ansiães e Santa Cruz da Vilariça deram lugar a outros, como por exemplo ao de Freixiel e ao de Vilarinho da Castanheira. Mogo de Malta tem a sua história ligada ao concelho de Freixiel, criado no séc. XII. Já anteriormente, D. Teresa, casada com D. Henrique de Borgonha, tinha doado Freixiel à Ordem de S. João de Jerusalém, também conhecidos por Hospitalários ou simplesmente Ordem de Malta. No momento da criação do concelho de Freixiel, Mogo, juntamente com Pereiros (e Codeçais), ficaram a pertencer-lhe. É possível que muitas das marcações ainda existentes sejam já dessa altura, mas outras foram feitas de novo ou avivadas em 1728. Desde Alagoa, passando junto à Igreja de Santa Catarina, continuando pelo Pé-de-Cabrito, seguindo depois a estrada para Folgares, descendo por Vale Covo, etc. é possível encontrar um vasto conjunto de cruzes gravadas nas rochas que delimitavam o território administrado pela Ordem de Malta em relação ao de Ansiães.
Actualmente há histórias bem curiosas sobre as casas situadas nesta zona de separação entre os dois Mogos: diz-se que há quem coma num Mogo e vá dormir a outro, mesmo sem sair de casa!

 A igreja de Santa Catarina estava ali perto por isso decidi visitá-la. Eis o que dela se dizia em 1758: “O orago é de Santa Catarina, tem três altares estando a Santa no do meio. Não tem o Santíssimo Sacramento. No altar da parte Sul está a Senhora do Rosário e no do Norte está um Santo Cristo que não haverá três anos, pouco mais ou menos, que dizem que faz milagres”. Já em 1766 dizia-se: “ a igreja tinha de nascente a poente e de comprimento sete varas e meia e de largo quatro varas e meia, estando a ser acabada de novo, com sacristia nova e capela-mor. O altar-mor, sem sacrário, onde está a imagem da padroeira, Santa Catarina, que está muito velha, tem dois altares colaterais, com a imagem de nossa senhora do rosário e no outro o Senhor crucificado”.
A igreja forma com o adro, o cemitério e uma pequena capela que ostenta, na porta em ferro forjado, as iniciais ATM e a era de 1898, um conjunto muito agradável à vista, com o granito à mostra. A nascente, nas traseiras da igreja, está em construção um novo edifício, igualmente em granito, que poderá ser uma estrutura de apoio.
Quando se entra não se pode deixar de reparar que é um templo pequeno, mas bonito e muito bem cuidado. Quase deu para reconhecer algumas das imagens de que falava o relato do séc. XVIII, mas há novas imagens e os altares estão em muito bom estado de conservação. O que despertou mais a minha atenção foram as bonitas pinturas, recentes, que decoram o tecto da capela-mor.

Saí da igreja e segui pela avenida mais espaçosa da freguesia. Aqui se encontra o edifício da Junta de Freguesia, um campo polidesportivo, a antiga Escola Primária, agora transformada em museu, e a “nova” Escola Primária, já sem a alegria das crianças do 1.ºCiclo mas ainda frequentada por um grupo do Pré-escolar.
Logo a seguir, à esquerda, a Av. Francisco Bernardo conduz ao Centro Social Paroquial de Mogos e ao Santuário de Nossa Senhora da Saúde. À direita há um minimercado e bar. A avenida termina no lugar mais espaçoso da aldeia, a Praça da Ordem de Malta, que agora tem um fontenário no centro. Decidi ir recuperar o carro, que abandonei logo quando cheguei. Para isso virei à direita pela rua Dr. João Trigo Moutinho, mais conhecida como Rua do Cimo do Povo. É nesta rua ladeada de casas humildes, com escadas exteriores em granito e varandas típicas, que se destaca uma casa, quer pelo volume e qualidade de construção, quer pelo jardim anexo. Trata-se da casa da família Pimentel. Nela podemos encontrar duas curiosidades que os habitantes de Mogo de Malta gostam de mostrar: um bonito relógio de sol em granito, encimando um largo portal lateral, também em pedra e o “Mogo”. A tradição popular não atribui a palavra Mogo à divisão ou extremo, mas sim a uma cabeça esculpida num bloco de granito que deve ter servido de sustentáculo ao corrimão da escada de entrada. Esta personificação da freguesia é bastante frequente e conheço situações idênticas em Zedes e Pereiros. Não deixa de ser curioso, e ainda não vi isto escrito em lado nenhum, o facto de logo abaixo da cabeça humana se encontrar, também gravada em alto-relevo, a cruz da Ordem de Malta. Este facto vai reforçar ainda mais a simbologia de que aquela cabeça representa realmente um habitante de Mogo de Malta.


João Inácio Teixeira Meneses Pimentel nascido em Mogo de Malta em 1859 foi uma figura ilustre. Engenheiro agrónomo, dirigiu a Estação Transmontana de Fomento Agrícola e foi cavaleiro da Ordem de S. Tiago.

Continua:
À Descoberta de Mogo de Malta (2ª parte)
Fontes históricas: Morais, Cristiano; (1995); Estudos Monográficos Vila Flor - Freixiel

sábado, 5 de junho de 2010

O alazão e o seu dono

Foi com alguma vaidade que mostrou o seu cavalo, ainda jovem, mas pujante, bonito. Talvez uma nova visita a Belver me proporcione a oportunidade de fotografar este belo cavalo num ambiente mais amplo.