Continuação de: À Descoberta de Belver (1/3)
A rua do Vale tem continuação pela rua da Escola. Nela não se ouvem os
risos das crianças e algumas casas estão desabitadas. É direita e larga,
contrastando com todas as das zonas mais antigas da aldeia. Liga a
caminhos vicinais que se estendem até Carrazeda de Ansiães.
Na antiga
Escola Primária funciona agora a sede da Liga dos Amigos de Belver. Constituída em 2006 e com muitos dos associados fora da aldeia, a
principal atividade da Liga tem sido a realização de um convívio nos
primeiros dias de agosto. No entanto, os seus objetivos são mais
ambiciosos e, em parte, têm sido conseguidos: melhoria das instalações e o
seu aproveitamento mais frequente; recuperação da fonte de mergulho da
canelha da Figueira e a aquisição e recuperação do moinho existente no
ribeiro do Moinho.
A falta de uso do recinto da escola é evidente, necessitando urgentemente de limpeza.
O
“recreio” é dos poucos pontos da aldeia de onde se avista alguma
paisagem. Não é difícil imaginar os campos cheios de vida. Aliás, isso
ainda se verifica nas pequenas hortas encostadas às casas, onde se regam
as alfaces, cebolas, tomateiros e pimenteiros, rodeados de flores, que
salpicam de cor todas as hortas transmontanas.
Na veiga, mais
latifundiária, só sobraram algumas leiras de batatas, já com flor,
outras de milho, culturas bem representativas do potencial agrícola das
terras.
Está na altura de segar a erva dos lameiros. As gramíneas floriram e os finos caules dobram-se com o peso das espigas. Os troques,
com a sua cor garrida, crescem hirtos nas paredes ao longo dos caminhos
com arranjos de verde de cenoura brava. As giestas negrais, que aqui
crescem como carvalhos, ostentam o que restou do seu manto amarelo,
recolhido por calejadas mãos para as passadeiras do Dia do Corpo de
Deus.
Ao longo das margens da ribeira do Moinho, que se estende até
próximo da Carrazeda, e continuando pela Veiga, há grandes retalhos de
terrenos férteis, outrora sustento de famílias numerosas, estão
reduzidos à alimentação do gado, também ele cada vez menos abundante.
Regressemos
às ruas. Caminhemos até ao largo da sede da Junta de Freguesia. O
edifício é pequeno, recente e não desperta muito a atenção. O elemento
de maior interesse neste largo é, sem dúvida, uma curiosa fonte datada
de 1924. Esta fonte é única no concelho, constituída por um depósito, um
tanque para os animais beberem, uma torneira para recolha de água e um
pequeno tanque para lavar a roupa. Estas últimas três valências estão
interligadas por um sulco do em granito por onde a água circula por
gravidade até se depositar do tanque de lavagem da roupa. Muito bem
situada, e ainda com plena utilização, esta fonte é um dos elementos do
património construídos com mais interesse em Belver.
Chegámos ao
ponto de partida. A aldeia é dividida pela Estrada Municipal 627 que no
interior da povoação recebe o nome de rua Marechal Gomes da Costa. É por
ela que se tem acesso a Belver e se pode sair em direção a Fontelonga.
As bonitas vivendas que existem na aldeia foram construídas à entrada,
de um e do outro lado da estrada. É também à entrada da aldeia que se
encontra um nicho muito recente, elegante, em granito, inaugurado em
2009. A imagem é de Nª Sª das Neves.
No interior da aldeia ladeiam a
estrada casas mais antigas, algumas com traça interessante. As curiosidades vão surgindo, como duas caras esculpidas, perto do largo da
Junta, um relógio de sol sobre um muro, depois do largo da Praça,
algumas pedras trabalhadas e datas gravadas nas vigas e fachadas das
casas. Sendo possível que existam habitações desde o séc. XII, a data
mais antiga que encontrei gravada foi 1668, sendo a maior parte do séc.
XX. Num beco está gravado MDCCLXV, em letras enormes, na viga de uma
porta.
Um pouco mais à frente surge a capela de Santo Cristo, visita obrigatória na Descoberta desta aldeia.
Nas
Memórias Paroquiais de 1758 são citadas como existentes em Belver 4
capelas: uma no cemitério, a capela da Visitação de Santa Isabel,
particular, tendo como administrador António de Morais, de Zedes; a
segunda na meio do povo, de Nª Sª do Carmo, particular, sendo
administrador António José Monteiro; a terceira no fim do povo, indo
para Carrazeda, a de S. Pedro, também particular, administrada por
António Gonçalves. A quarta era precisamente a capela de Santo Cristo.
“Tem
mais esta freguezia outra Capella que há poucos anos que se principiou
que ainda nom esta benta”. A julgar pela data inscrita por debaixo do
parapeito de uma das janelas terá sido concluída em 1765. Contam as
pessoas que foi mandada construir por um emigrante no Brasil, que, sendo
colhido por uma tempestade numa das suas viagens, prometeu construir
esta capela por quanto chegasse bem à sua terra natal. Tendo
sobrevivido, cumpriu a promessa.
As Memórias Paroquiais contam uma
história um pouco diferente. A capela foi construída com a contribuição
de doentes que se curaram, “como se verefica dos mylagres que nella
estam” (deveria estar a referir-se ao que conhecemos hoje por ex-votos, e
que não existem na capela) e com dádivas dos fiéis.
Continua em: À Descoberta de Belver (3/3)
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