Continuação de: À Descoberta de Mogo de Malta (1ª parte)
Já de automóvel, continuei a subir a rua e segui pela esquerda em direcção ao antigo campo de futebol, onde ainda joguei algumas vezes. Surpreendeu-me a grande quantidade e dimensão dos castanheiros que ainda é possível encontrar. Esta saída do núcleo habitacional destinava-se a visitar umas antigas alminhas, conhecidas como as alminhas da Fraga do Medo. Dada a proximidade a um marco geodésico, não me foi difícil encontrá-las. Há naturais que ainda se recordam de aí existir um retábulo de madeira representando o purgatório. Hoje apenas se notam três buracos abertos na rocha, talvez destinados a prender o dito retábulo. Não me foi confirmado por ninguém, mas é possível que também tenha existido uma cruz em madeira sobre a rocha.
Estes monumentos às Almas do Purgatório foram erguidos nos caminhos e à entrada das localidades. Entre a fraga onde se encontram estas alminhas e a que serve de base ao marco geodésico (785 metros de altitude) passa um caminho que, desde tempos imemoriais, liga Freixiel a Mogo de Malta. Já em tempos recentes, era utilizado pelos habitantes de Freixiel para se deslocarem às feiras a Carrazeda de Ansiães. Este local, com uma fraga larga e solarenga foi utilizado no passado para brincadeiras de crianças ou para encontros amorosos nas tardes de Domingo, até para bailaricos! Com a edificação do santuário, este passou a ser o local de encontro. Também era desta fraga que as pessoas se concentravam para apreciar o fogo-de-artifício lançado no Cabeço, na festa de Nossa Senhora da Assunção nas noites de 15 de Agosto. Nada fornece indicação a respeito do nome, “Fraga do Medo”, nem sequer o tamanho das ditas fragas, que, mesmo antes de serem em parte cortadas para a construção civil, não deviam apresentar um tamanho medonho. Arrisco uma explicação: sendo um caminho com alguma circulação de pessoas, que, neste local, passa entre dois conjuntos de rochas graníticas, a poucas centenas de metros da aldeia, seria um bom local para salteadores e malfeitores esperarem e surpreenderem os viajantes.
A etapa seguinte foi o moinho de vento e a calçada. Contrariamente ao que alguns moradores já me tinham afirmado, o moinho movido a vento funcionou mesmo, fazendo a farinha necessária para o fabrico próprio de pão. Estruturas semelhantes existem em Carrazeda de Ansiães, Vilarinho da Castanheira e Lousa.
Terão também existido pelo menos dois moinhos movidos a água.
De junto do moinho de vento parte a Calçada de Mogo de Malta. A sua cronologia é indeterminada. Destinava-se a proporcionar o acesso a terrenos agrícolas numa zona de forte inclinação e com enormes rochedos. Talvez se prolongasse até Freixiel, seguindo para Vila Flor ou apenas chegasse junto da Ribeira da Cabreira. Há residentes que se recordam se não da construção, pelo menos de obras de recuperação, dado que todos os recantos eram cultivados e havia boas hortas com água para rega.
É muito agradável fazer o percurso da calçada. São aproximadamente 600 metros, com troços muito bem conservados e com uma vista lindíssima para o Vale da Cabreira que pode ser admirado em toda a sua extensão. Na encosta em frente distinguem-se algumas construções encaixadas nas fragas, fazem parte da Quinta do Pobre. Quase consegui ver as laranjeiras carregadas de frutos douradas, que rodeiam o poço onde o senhor Manuel pendurava a pão, à falta de frigorífico.
Não muito longe da calçada, situa-se a Santuário de Nossa Senhora dos Saúde. É o local ideal para apreciar a aldeia e também toda a paisagem em redor, desde o alto da Senhora da Graça, em Samorinha, até ao cabeço de Nossa Senhora da Assunção, em Vilas Boas. O interior da capela é muito simples. Não há qualquer elemento decorativo, simplesmente as imagens de Nossa Senhora da Saúde e de Jesus crucificado. Junto à porta lateral uma placa lembra a curta história deste espaço. A primeira pedra para a construção da capela foi lançada em 19-07-1954 e a inauguração aconteceu em 17-04-1955. Coincidência, há exactamente 55 anos!
Neste local, no último fim-de-semana do mês de Julho, realiza-se grandiosas festas. Das muitas vezes que estive presente nestas festas, recordo alguns anos em que os andores eram decorados com sementes germinadas e com aparas de madeira, vindas das várias tanoarias que ainda existem nos dois Mogos. Esta prática parece ter-se perdido.
Se não fosse a instabilidade climatérica teria ficado mais tempo neste local tranquilo e inspirador, mas dirigi-me para o Museu Etnográfico. Fiquei admirado com a quantidade e riqueza do acervo. Os objectos estão cuidadosamente agrupados, formando pequenos núcleos, facilmente identificáveis. Podemos encontrar a sala de aulas, a cozinha, o quarto e um vasto conjunto de alfaias agrícolas e de carpintaria. É digno de ser visitado!
Para terminar a minha visita à freguesia de Mogo de Malta dirigi-me ao lar de idosos. Os utentes desta instituição são vinte e dois, quase todos mulheres. As instalações são espaçosas e estão meticulosamente limpas. Sentei-me durante algum tempo na sala de convívio. Acharam piada, alguém interessar-se pelo passado. Conversei demoradamente com Manuel dos Anjos (mais de 90 anos de idade), mas muito lúcido, que me falou do Mogo da sua juventude. É preciso ouvir os idosos, eles têm muito para nos contar e nada voltará a ser como antes.
A última paragem foi no café da praça. Mais um espaço de convívio, de conversa, de descoberta da particularidade da vida das pessoas. Basta saber ouvir. Regressei a casa já de noite. Uma freguesia tão pequena, que nem sequer tem eleitores suficientes para eleger uma Assembleia de Freguesia, tendo que funcionar em plenário de cidadãos, tem tanto para mostrar a quem a queira visitar!
Publicado no jornal "O Pombal", em Maio de 2010.
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